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DEPRESSÃO É PROBLEMA BIOLÓGICO

Quando se trata de doenças humanas, poucas são piores que a Depressão. Ela é absurdamente incapacitante e inacreditavelmente comum. Por isso é tão importante falar sobre ela!

A Depressão elimina qualquer capacidade de se sentir alegria ou prazer. Nós [humanos] temos uma capacidade surpreendente de extrair esperança ou significado das circunstâncias mais difíceis… Por isso, nada pode ser pior do que uma doença cuja característica definidora é "incapacidade de sentir prazer".

(link: DEPRESSÃO: Problema Biológico)

A Depressão é tão biológica quanto o Diabetes — ambas as doenças são caracterizadas por desequilíbrios bioquímicos e hormonais… Nós não dizemos ao diabético para simplesmente “superar” a falta de insulina; mas é exatamente isso o que acontece com os depressivos!


OS SINTOMAS

  • ANEDONIA – Ausência de prazer: nada traz alegria, nem uma boa sorte, nem uma promoção, nem uma conquista.
  • TRISTEZA – Luto: perda e desesperança; obsessão por ações que deram errado; às vezes, com pensamento delirante. Culpa: culpar-se por falhas reais ou imaginárias, culpa por se culpar, culpa de estar triste e incapaz.
  • RETARDO PSICOMOTOR – Tudo é exaustivo:fazer, pensar, mover; começar é incrivelmente difícil.

Externamente: parece estar cansado e preguiçoso (como se nada acontecesse). Internamente: há uma intensa resposta de estresse (como o corpo faria se fugisse de um assaltante armado).

  • DISTORÇÕES COGNITIVAS – Problemas com memórias e pensamentos:ver faces neutras como "tristes"; fazer uma avaliação de mundo irrealisticamente "pessimista".
  • RUMINAÇÃO – Tendência à persistência: repetindo várias vezes o mesmo pensamento disfuncional.

  • SINTOMAS VEGETATIVOS – Hiperativação simpática: disparando adrenalina e cortisol. Desregulação do sono: despertar precoce; ciclos de sono desordenados. Desregulação alimentar: perda de apetite é comum.
  • AUTO-INJÚRIA — Suicídio:maistentativaem mulheres, maisconcretizaçãoem homens. O momento mais perigoso é ao sair de Depressão muito grave (quando o retardo psicomotor alivia, mas outros sintomas permanecem).

Na pior Depressão, não há capacidade de executar uma ação ou obter controle. Quando os sintomas melhoram — o suficiente para "agir", mas ainda extremamente deprimido —que o suicídio é mais comum.


ELEMENTOS BIOLÓGICOS

O ponto crucial é que a Depressão é uma doença biológica! Seus elementos biológicos tocam no papel dos neurotransmissores — serotonina, noradrenalina, dopamina — bem como de fatores hormonais, genética e áreas cerebrais específicas. Seus elementos psicológicos estão intimamente ligados à biologia do estresse.

Os neurotransmissores

Neurotransmissores são mensageiros químicos pelos quais os neurônios se comunicam. Os sintomas depressivos resultam de misturas tóxicas de deficiências dos três neurotransmissores principais:

  • DOPAMINA — ligada à via do prazer —a "insuficiência"gera anedonia. A ausência de prazer passa pela rota da desesperança. Sem esperança não tem o "Vai ser legal! Vou fazer isso!" sinalizando em seu cérebro e não há a ação — e não se obtém resultado… confirmando desesperança original.
  • NORADRENALINA— basicamente é um estimulante —a "insuficiência" gera retardo psicomotor. Falta de estímulo significa menos ação, menos energia direcionada a movimento e sensação de baixa energia. Os antidepressivos iMAO (inibidores da monoamino-oxidase) melhoram a Depressão aumentando a NOR.
  • SEROTONINA — ligada a sintomas obsessivos —a "insuficiência" gera ruminação e tristeza. Os sintomas do TOC podem ser aliviados por antidepressivos ISRS (inibidores seletivos da recaptação de serotonina).

Antidepressivos—que modulam os neurotransmissores—tratam a Depressão. O problema é que funcionam "molecularmente" (aumentam neurotransmissores no cérebro) em horas; mas não melhoram "sintomas depressivos" senão em semanas. Portanto, a Depressão não é necessariamente “falta" de serotonina, noradrenalina ou dopamina — ela está relacionada à “auto-regulação" desses neurotransmissores.

  • Substância P — neurotransmissor liberado quando o corpo sente dor (aguda ou crônica). Drogas que inibem a Substância P aliviam Depressão — mostrando que usamos vias reais de dor para a "dor psíquica".

As áreas cerebrais

Para entender o cérebro na Depressão, precisamos antes saber como um cérebro funciona—a Teoria do Cérebro Triuno ilustra isso:

  1. A parte inferior é Instintiva (Reptiliana) → lida com os assuntos básicos de respiração, pressão, circulação — apesar de fundamental para a vida, não tem muito a ver com as emoções.
  2. No meio, é o Sistema Límbico (Mamífera) → é o centro das emoções — comunica-se com o resto do cérebro e desencadeia respostas no corpo.
  3. No topo, há o Neocórtex (Racional) → é o centro dos pensamentos — capaz de ativar o resto do cérebro e desencadear respostas no corpo por meio de pensamentos, que são reações químicas de neurotransmissores e quanto mais ocorrem, mais forte é o caminho e o sinal.

A Depressão é [simplesmente] o Neocórtex, em algum nível, sussurrando sem parar "pensamentos tristes" para o resto do cérebro. Uma vez que isso começa, a bioquímica vai mudando… até que o Neocórtex fique preso em sua própria armadilha — e ele não pode mais parar de pensar esses pensamentos, pois toda a sinalização já repete-os indefinidamente!


A anatomia da Depressão é evidenciada pela Neuroimagem. 

O Sistema Límbico tem hiperatividade da Amígdala (processa "medo, agressão e memórias emocionais") e do Cíngulo Anterior (processa “empatia, dor"). O Neocórtex tem hiperatividade do Córtex Subgenual (processa “ruminação”)

Cingulotomia anterior → procedimento neurocirúrgico no Cíngulo Anterior (reservado a casos raros gravíssimos resistentes a tudo) que corta as conexões entre a amígdala e o córtex frontal — e melhora a Depressão.

Os hormônios

  • Hormônios tireoidianos → ligados a metabolismo, temperatura corporal, níveis de energia — são causa de algumas depressões; mas [geralmente] eles são um pouco do retardo psicomotor.
  • Ciclo fisiológico feminino → as mulheres têm 2x mais Depressão do que homens — e os piores momentos são pós-parto, pós-menopausa e pré-menstrual (quando os hormônios variam loucamente). Além disso, mulheres tendem a ruminar muito mais sobre coisas emocionalmente perturbadoras.
  • Glicocorticóides → hormônios do estresse liberados pelas supra-renais são diretamente associados à Depressão. Eles podem transformar os pensamentos ruminantes no “trem descarrilado” do desamparo. O cortisol elevado aumenta limiar de prazer, reduz os neurotransmissores e danifica o hipocampo — quebrando a regulação do cortisol (ciclo vicioso).

A genética

A Depressão possui algum grau de herdabilidade: 50% gêmeos idênticos, 25% irmãos. Assim, há aqui uma interação entre natureza e experiência. A vulnerabilidade genética da Depressão é no transportador de serotonina (5-HTT). E os glicocorticóides regulam a expressão do 5-HTT. Tenha a “versão ruim” genética do 5-HTT — acrescente os principais fatores de estresse – e há aumento de 30 vezes na chance de Depressão grave!


“Se fosse definir a Depressão em uma frase, diria que é: um distúrbio bioquímico, com componente genético e influência de experiências prévias, onde alguém não consegue mais apreciar o pôr do sol.” — Robert Sapolsky


ELEMENTOS PSICOLÓGICOS


Passe por um enorme estresse (“cisne negro”) e acrescente os pensamentos ruminativos — o resultado disso é: seus pensamentos desequilibrando suas emoções o tempo todo… E você pode não conseguir sair desta vez — e terá, então, um episódio de depressivo.

A resposta de estresse é a mesma em qualquer estressor: físico ou psíquico. Todo estressor passa pelo cérebro — o cérebro é o "centro da realidade" — e você tem, portanto, uma resposta física de estresse para um estressor psíquico (tão real em seu corpo quanto se ele acabasse de ser agredido). Normalmente, conseguimos evitar a Depressão — nosso corpo tem mecanismos de recuperação e a redução de neurotransmissores costuma ser transitória. 

Estresse e Depressão andam juntos. Perca um dos pais (por falecimento) quando você tem menos de 10 anos — e o risco de Depressão dispara. Ter a genética gera a Depressão [apenas] após "eventos ruins" na vida. 

Passe por 3 a 4 episódios depressivos e não aumenta chance de novo episódio. [Mas] tenha 4 a 5 Depressões e pode-se entrar num ciclo repetitivo — o ciclo pode simplesmente seguir por conta própria.

A psicodinâmica

Perca algo valioso (pessoa, objetivo, conceito, sonho)… No luto, nós nos recuperamos; na melancolia, não. No luto, você foca no amor dos entes-queridos e consegue "sair" da sensação de perda. Na melancolia, você não consegue colocar o negativoem segundo plano— e ele vai crescendo.

Infelizmente — justo enquanto isso acontece — é quando todas pessoas úteis na sua vida começam a te criticar e dizer pra você "superar isso"… E agora você tem com a dorde perder e a culpa por perder a chance de "consertar isso".

"Depressão é agressão voltada para dentro." — Freud

O desamparo aprendido

Quando estresse e ruminação são internalizados, abrem caminhos para o desamparo — a sensação que não há saídas para a frustração, que a vida só agrava e tudo é estressante, que você não tem controle, nem previsibilidade, você perdeu a resiliência e perdeu o suporte social. Ao "perder" o controle, você aprende a ser indefeso… e você desiste. Você não consegue perceber que sua ruína (apesar de horrível) não é total — ao contrário, você generaliza-a e ela torna-se o "seu mundo" inteiro.

O que mais está acontecendo? O que afeta o peso do estressor?

  • Saídas para a frustração—você tem mecanismo de alívio do estresse?
  • Sistema de suporte social — você tem uma rede de apoio social?
  • Controle — você sente que pode controlá-lo? (sensação de controle é boa se a situação é "ruim mas podia ser pior" — mas, é debilitante se a situação é "tão ruim o quanto podia ser" … controle nem sempre é vitória).
  • Previsibilidade — você tem senso de previsibilidade e tempo?

Pesquisas na área mostram que animais (cães e ratos) quando extremamente estressados: aprendem o desamparo e não evitam mais os choques dolorosos— choques que eles não podem controlar. Eles perdem o interesse por sexo, alimentação, higiene e manifestam retardo psicomotor, auto-mutilação e insônia. Pode-se tratar o desamparo com antidepressivos e eletroconvulsoterapia.

Seres humanos não são diferentes (estudo de ruídos inescapáveis) e também podem ser levados ao desamparo: se aprendem "que não podem ser amados" e "que eles não podem fazer algo sobre isso" — e desenvolvem Depressão.


INTEGRAÇÃO FINAL

Ao longo da vida, 15% das pessoas terá (ao menos) um episódio depressivo. Nos últimos 50 anos, a prevalência da Depressão vem aumentando e a OMS estima que, até 2025, ela será a segunda causa de incapacidade no mundo. Ademais, no tratamento da Depressão existem altas taxas de resistência a medicamentos — o que demanda a integração de abordagens biológicas e abordagens psicológicas para manejo ideal dessa doença.

Enfim, a Depressão é uma doença real — não é um falso problema de chorões preguiçosos… Por que isso importa? Porque falar disso é sempre um tabu — visto como uma hipérbole de reclamações ou evitado para que o assunto não veja a luz do dia. É muito importante ensinar que Depressão é real e normal, da mesma forma que diabetes é real e normal — simplesmente acontece. É uma doença grave e potencialmente fatal, mas não reflete mais sobre uma pessoa do que as outras doenças.